quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

Abraços de Rios

por Betha Mendonça

Rendo-me aos abraços
Dos braços destes rios
Águas a envolver a cidade
Encantamento diário
Paisagem tão conhecida 
E diversa a cada instante...

Quem dera eu ser dela 
parte do tanto que me falta!

Já alta a madrugada 
Eu entretida em olhares 
A desembaçar as vidraças
A transpirar nas janelas
A umidade da chuva...

Quem dera eu ser dela 
parte do tanto que me falta!


terça-feira, 30 de janeiro de 2024

Despertar

Betha Mendonça

Luzes da cidade sob meus olhos,
E lá pras bandas das ilhas, 
Um brilho aqui outro ali,
Estrelas nas marolas do rio.

Ah, brisa dos bons ventos!
Novos tempos que se abrem!
 
Horizontes tingidos, 
A cada momento,
Em que deito esse olhar,
Sobre a cidade aos meus pés.

Novos tempos! Novos ventos!
E o barco a se afastar do cais...

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

Evocação a Poesia

Betha Mendonça

Fale de campos floridos
Estações do ano em festas
Pássaros em voo no ar
Porque a poesia é eterna

Ilumine a minha existência fria
Com lampiões de esperança
E se partir com os que já foram
Não esqueça de deixar acesa a luz

domingo, 28 de janeiro de 2024

Carta de Amor Número 12

Belém, 28 de janeiro de 2024.

 Amado meu,

Passados e pesados anos de um amor morto, que ressuscita a cada cisão do meu ser, eu venho dar-te mais uma vez adeus. Vês essas mãos já sulcadas? Cansaram de adular-te em preces e afagos. O olhar cego, a girar na orbita da tua aura, sol sem luz nem calor já há muito perdido da minha direção.

Despeço-me da loucura dessa vida de esperanças e perdas diárias. Do dia após outro... longas voltas por dentro das saudades. Do que eu fui e me tornei nesse seguir-te ao vento das vontades. Quero-me longe. Lugar protegido de qualquer ponto onde possas me achar. Dentro ou fora da tua mente, esse totem de inconstâncias, a honrar um tempo ido, na entrada da oca vazia que me tornei.

Não sei o que se faz dentro de mim. Esse desejo de estar sempre a despedir-me. Como se não fosse cada instante dessa vida uma despedida. Talvez meu desejo de ir encontro ao desconhecido, seja menor que a coragem do conforto desse cais.

Assim, eu passo várias vezes do meu dia, a olhar do alto do meu aquário particular, o rio Guamá, as ilhas...o movimento das águas, chuvas e embarcações. E a cada pôr do sol pintado sobre toda essa paisagem sempre tão diferente, eu acabo deixando para além da vontade o derradeiro adeus...

Beijos,

Betha  Mendonça

sábado, 5 de setembro de 2020

Fotografia P&B

sou saltimbanco
amante e amiga
a dor no flanco
alicerce e viga
beira de barranco
planície que abriga
foto preto & branco
coisa bem antiga...

 

domingo, 24 de fevereiro de 2019

Sobrenome


por Betha Mendonça

Esporas nas ancas dia a dia
Mesa vazia de muita fome
Assinam nome e sobrenome

Ao papel lágrima e sangue
E lástimas, solidões e esperas
Pendem do anelar esquerdo

Horas soltas de sentidos
Avisos à porta da geladeira
Lençóis e carnes desfeitas

Manhãs de sol - tardes de chuvas
Perdidas na insônia das noites
Horas mancas de nunca mais...

Fora à volta ao que não tive
Baila a dança do tempo
E despe-se palavra que cative!

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Vestida de Humanidade


por Betha Mendonça

Ah, negra aura da chama humana,
Que me mantém mui distante,
Do que a alma clama à divindade!...

Carrego essa nódoa no peito,
Despeito de todo dom e bem,
Invejo o que os anjos têm.

Sou humanamente divina,
E de dentro dos meus erros,
Sucumbo a Eros e seus apelos.

Cobiço o homem que amo,
Com olhos de Demo o chamo,
E queimo em luxúria e vaidade.

Vestida de pouca castidade,
Com a pureza de uma louca:
Consciência do mal em mim é pouca.


sábado, 12 de janeiro de 2019







 Sou Belém!
by Betha Mendonça

Sou grande parte da paisagem, 
Chuva fina das duas da tarde, 
Quem vê Santa de passagem, 
E reza com fé e pouco alarde. 

Tenho um pouco de marajoara, 
Perfume das ervas mal colhidas, 
Cachos de frutas multicoloridas - 
Ver-O-Peso, açaí ou juçara! 

Trago nas veias água barrenta,
Do Rio Guamá e do mangal, 
Da Escadinha sou vestimenta, 
Da garça o sobrevôo habitual... 

Ah, Santa Maria de Belém! 
Dos morteiros barulhentos do Círio, 
Envolta no manto do eterno bem, 
Nossa Senhora de Nazaré é o “lírio”, 
A melhor crença que o belenense tem! 

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Alma de Palhas

por Betha Mendonça

Dessa alma feita de secas palhas,
Sob imenso campo de girassóis,
Com fortes ventanias tu me espalhas,
Em feixes de mim cada vez mais sós.

O vento leva-me partes às calhas,
Onde sou ninho para os rouxinóis,
Dessa alma feita de secas palhas,
Sob um imenso campo de girassóis...

Adiante, tecida em finas malhas,
Sou esteira, paneiro, rede e lençóis,
E tudo que em mim tu trabalhas,
Pode transformar os feixes e nós,
Dessa alma feita de secas palhas...




sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Santo de Avatar

por Betha Mendonça

ah, caminho de dor,
no campo de pisar,
por sobre o falso andor,
dum santo de avatar!

pés que partem daqui,
são crentes sem a fé,
que tateiam pelo chão,
a achar o que nem é...

sai do lábio vazio,
a prece de assunção,
por tal ente sombrio.

fé por milagre vão,
sem devoção nem voz,
benção, nem beija-mão.

quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Estrela do Norte

Betha Mendonça


Não há passo que eu dê sem que volte ao norte, para essa Belém abraçada pelas águas dos rios, de céu cheio da azul e cinza. Das garças e urubus.

As ilhas a espreitar o movimento das embarcações e aviões sobre a Baia do Guajará. A Praça do Açaí cheia de frutos e toda sorte de gostosuras que vêm de lá.

Dias e noites, sentimentos e sentidos, e, “cantaventos” dos prédios antigos a levar música aos paralelepípedos das ruas estreitas da Cidade Velha.

A Cidade Velha é velha desde que nasci. Ora, aos meus olhos embaçados pela chuva repentina, eu vejo que envelheci mais rápido que ela.

O norte é meu estado, minha estrela de papel, meu canteiro de palavras que vez por outra floresce...


quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Outros Haicais

por Betha Mendonça

I

na chuva de junho,
além da curva do rio,
açaizal ao vento.
II
acima das nuvens,
quarto crescente da lua,
no céu  de verão.
III
depois do açaí,
na rede de miriti,
descansa o caboclo.

segunda-feira, 4 de junho de 2018

sábado, 28 de abril de 2018

Sangrar a Vida


por Betha Mendonça

...a vida sangra,
sangue é vida...

...vermelho rutilo
colore o amor,
esquenta o corpo,
rebenta vasos...

...em fuga se põe,
se ferido o coração,
e explode o útero,
na menstruação...

...sem seu aporte:
frieza e lividez,
silencio e morte!...

domingo, 18 de fevereiro de 2018

Sobre a Felicidade


por Betha Mendonça

Felicidade é uma luz que não pode ser captada pela lente de uma câmera num momento feliz. Seu brilho é tão forte que queima a retina dos invejosos e aparece na foto somente um branco fantasma, sem forma definida.

A felicidade esvai-se por todos os orifícios do corpo. E por ser chama tão forte, quente e brilhante; fica o sol pálido de ciúmes e a lua entristecida por ser o luar tão pequeno perante ela.

É um estar em si e em tudo o que existe. E que não resiste em propagar-se num desejo absurdo, que o Cosmos inteiro possa sentir toda aquela explosão.

Como a criação do Universo ou o Caos, um Big Bang interior, que se propaga em tudo que se toca, cheira, escuta, vê, e, delicia-se em sabores tão diversos, incapazes da caber dentro de versos.

Um arrebatamento, uma música inebriante. Um feitiço que só sabe aproveitar e beber até o último gole, quem não vive com dó de si próprio. Que baila sobre as tristezas, dores e decepções, por que ser feliz é para quem ousa sê-lo. Quem ri de si mesmo, quem minimiza os problemas, por saber que todo mundo os têm.

Felicidade é voar sem asas, correr sem pés, colorir sem tintas, amar a natureza e o natural, sem nada dizer ou mostrar aos outros, por que de longe a gente a percebe...



quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

Sangria

por Betha Mendonça 

corta-me!
sê punhal 
a sangrar- me
dores e amores

seja eu 
sangue e seiva
sulco de rio
a irrigar-te...


segunda-feira, 26 de junho de 2017

Ilha de Gelo


por Betha Mendonça

cruzei o mar dos meus sonhos
nas ondas dos teus cabelos
a afagar-te e afogar-me
n’águas salinas d’amores

naveguei e naufraguei
entre teus indicadores
a apontar-me outro nome

por inveja e desgosto
isolei-me numa ilha
até encobrir-me seu gelo

*Poemas para Ulisses

sábado, 10 de junho de 2017

Poemas de Ninar

por Betha Mendonça

teus versos
antigas canções

na noite
embalam-me o sono

redes
de poemas de en_cantar


sexta-feira, 21 de abril de 2017

Depois

por Betha Mendonça

depois dela e dele
não há depois

silencio de morte
cala aos ouvidos
contas do rosário
colorem preces ao chão

não há mais ela nem ele
nem velas nos altares
derruídos em oferendas
e quebras de promessas

não há suplica nem assunção
nem mais bate um coração

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Passos

by Betha M. Costa

ah, passos...
promesseiros sem fé 
posseiros da planta do pé

presos ao cimento das horas 
nem o todo nem as sobras 

do que nunca foi e nem é...